Cuidar do meio ambiente é cuidar da boa criação de Deus

Na história, o luteranismo foi resiliente, e ao abraçar a causa climática, Natan quer ser também

Se há quem busque um rótulo para si, há também aqueles que desejam superá-lo ou, no mínimo, mesclá-lo a outras denominações. Quando Natan de Oliveira Schumann hesita se autodenominar um ativista, na verdade se lança a um segundo olhar: o de analista. A causa é a mesma, o combate às mudanças climáticas, mas as percepções e trabalhos são diferentes. No caso dele, surge do desejo de se tornar um profissional de Relações Internacionais. Está se formando na área e, aos 23 anos, tenta conciliar os dois lados.

Sente-se à mesa com um ambientalista e descubra as insatisfações que surgiram na infância. Para o menino Natan, de Sapiranga, a lembrança de um episódio de mortandade de peixes — 200 toneladas — no Rio dos Sinos, que banha cidades do Rio Grande do Sul, nascendo nos morros do município de Caraá e desaguando no Rio Jacuí. A causa fez as notícias circularem rápido: contaminação por resíduos industriais, de muitas empresas. Nas escolas, em especial no sul do país, o desastre virou conteúdo sobre poluentes. “Mesmo sendo uma criança, me chamou muita atenção”, conta.

Esse primeiro contato com um problema ambiental foi o impulso para iniciar os estudos na área. Com o conhecimento e senso crítico de uma criança, fez o que pôde, consumindo as notícias disponíveis e tentando compreender o caso do Rio dos Sinos. “A partir daí, consegui reconhecer as mudanças climáticas como o problema que hoje mais tem afetado o mundo”, relata Schumann. Mas então volta a questão: ativista ou analista? Ele escolhe ambos. Como ativista, pode se organizar, protestar e influenciar pessoas, enquanto, como analista, pode agir com autoridade científica, política e econômica à medida que avança sua formação.

Dos vários cenários para a discussão do meio ambiente, Natan optou pelo caminho da igreja. Sendo vice-coordenador do Conselho Nacional da Juventude, uma entidade vinculada à Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), ele utiliza seu papel de liderança juvenil para informar, debater e mobilizar os jovens cristãos. Embora a questão ambiental não seja o foco central do grupo, ela também é abordada. Em 2022, as lideranças publicaram a cartilha Juventudes & justiça ambiental em uma campanha que busca a reflexão sobre as condições atuais e futuras do planeta. Schumann ajudou a coordenar.

No mundo, os luteranos formam quase 80 milhões de membros, de acordo com a Federação Luterana Mundial (LWF). No Brasil, esse número ultrapassa 700 mil, segundo estatísticas da IECLB. A família de Natan se soma aos fiéis, tanto que ele foi batizado como luterano, mas por muito tempo, os Schumann foram não praticantes. Isso mudou quando o ativista (e me prendo a esse termo para facilitar) concluiu o ensino confirmatório, que é equivalente à catequese na tradição católica. “Comecei a ter mais contato com a igreja e percebi que estava satisfeito. Isso também fez com que minha família voltasse. Naquela época, não esperava que fosse me envolver tanto da forma com a qual me envolvo hoje”, ele conta.

Natan nasceu em Sapiranga, mas reside e estuda em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. Foto: Pedro Carcereri/Old Man Artes.

Ao abordar a relação entre a fé cristã e o meio ambiente, ele aponta a existência de diversas correntes dentro da instituição. Variam, indo desde igrejas mais progressistas até as conservadoras. As pautas sociais são interpretadas por documentos e lideranças nos centros religiosos, e com a discussão ambiental não é diferente. Schumann explica: “Eu faço parte de uma igreja luterana que, no Brasil, é mais aberta com a pauta ambiental. A instituição reflete sobre o meio ambiente, na responsabilidade social e teológica. Acontece quando refletimos sobre o nosso papel como cristãos”.

Nas religiões que consideram a Bíblia como escritura sagrada, Deus é descrito como o Criador, a causa primordial que deu origem a tudo o que existe. O Livro do Gênesis relata a criação da água, das matas, da terra, dos animais e de todos os elementos que compõem o planeta Terra. Além disso, é mencionado que “o Senhor Deus pôs o homem no jardim do Éden, para cuidar dele e nele fazer plantações” (Gênesis 2:15). Essa passagem, em muitas interpretações, coloca a missão do ser humano como um protetor consciente da criação, em outras palavras, do meio ambiente.

O propósito da vida humana é um fator importante para entender como os ativistas ambientais das igrejas cristãs enxergam a conexão entre Deus e o planeta. Como os próprios jovens luteranos escreveram em Juventudes & justiça ambiental, Gênesis cita que o ser humano e a natureza "se pertencem mutuamente": "O ser humano foi criado por Deus do pó da terra e, quando deixar de respirar, voltará ao pó da terra" (Gn 3.19). Para os ativistas, aí também entra a interpretação de outra parábola: "Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento. E amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Lucas 10: 25-37). Em outras palavras, amar a natureza é amar ao homem e a mulher.

As religiões protestantes, ao longo da história, foram resilientes às transformações do mundo, mesmo enfrentando períodos de perseguição. Segundo Natan, é crucial que essas religiões utilizem sua experiência, conhecimento e esperança para mitigar as alterações climáticas. "Essas instituições podem contribuir, não apenas por sobreviverem em tempos difíceis, mas ao refletirem sobre as dificuldades que ajudaram a criar", afirma. Para isso, também propõe a inclusão dos jovens nos espaços, tanto dentro quanto fora da igreja, repensando o mundo por outras perspectivas. Essa abertura, segundo ele, só será viável quando a vontade partir daqueles que já ocupam espaços de liderança.

Apesar das divergências entre as religiões cristãs, o zelo pela Terra tem representado um propósito em comum. O papa Francisco, maior autoridade da Igreja Católica, publicou em 2015 a encíclica Laudato Si (“Louvado sejas”, em português), endereçada a toda a humanidade. Em 246 parágrafos, o Sumo Pontífice reflete, adverte e orienta os leitores a respeito da conexão moral e espiritual que todos devem estabelecer com as questões socioambientais. “Os jovens exigem de nós uma mudança; questionam como podem construir um futuro melhor sem pensar na crise do meio ambiente e no sofrimento dos excluídos”, escreveu o Sumo Pontífice. Desde então, juventudes cristãs no mundo todo se unem pelo Movimento Laudato Si'.

Um dos pontos mais importantes para Schumann ao discutir as mudanças climáticas é o diálogo intergeracional. Foto: Pedro Carcereri/Old Man Artes.